
Novas abordagens para o desenvolvimento de vacinas no século XXI incluem o design de imunógenos baseado em estrutura, plataformas de vacinas genéticas e formulação de antígenos recombinantes com adjuvantes potentes.
Essas tecnologias estão gerando resultados promissores no desenvolvimento de vacinas para doenças globalmente relevantes, como tuberculose, influenza e vírus sincicial respiratório (VSR). Aqui, destacamos os desenvolvimentos mais importantes nessas áreas nos últimos 18 meses.
Avanços Recentes no Desenvolvimento de Vacinas no século XXI
Novas estratégias para o desenvolvimento de vacinas no século XXI têm gerado resultados animadores nos últimos meses. Focando nas infecções por vírus sincicial respiratório (VSR), influenza e tuberculose (TB), Fauci e Mascola discutem o impacto do design estrutural de vacinas, das plataformas genéticas e dos avanços no uso de adjuvantes.
Principais Avanços
- A estrutura em nível atômico da proteína de fusão do VSR forneceu informações cruciais para a produção de uma vacina candidata estabilizada, que demonstrou imunogenicidade robusta em um estudo de fase I.
- Avanços técnicos em vacinas de RNA mensageiro (mRNA) resultaram em maior estabilidade intracelular e melhor expressão de antígenos, levando a respostas imunes robustas e duradouras.
- Vacinas candidatas de mRNA codificadas para hemaglutinina completa de duas cepas pandêmicas de influenza demonstraram segurança e imunogenicidade em estudos de fase I.
- Uma vacina subunitária de tuberculose (TB) baseada em uma proteína recombinante de fusão (M72) e formulada com um potente adjuvante (ASO1E) foi eficaz na prevenção da ativação da TB pulmonar em adultos infectados de forma latente.
- A revacinação de adolescentes não infectados com a BCG proporcionou proteção contra a infecção por Mycobacterium tuberculosis.
As vacinas mais bem-sucedidas são altamente eficazes na geração de imunidade duradoura contra patógenos e promovem a imunidade coletiva, reduzindo drasticamente a propagação da infecção. Ao longo dos anos, vacinas para mais de 30 patógenos bacterianos e virais salvaram centenas de milhões de vidas.
No entanto, certos patógenos, incluindo HIV, malária e VSR, continuam sendo desafios para os esforços de desenvolvimento de vacinas. Além disso, as vacinas atuais para doenças globalmente importantes, como tuberculose e influenza, são subótimas, deixando bilhões de pessoas vulneráveis.
Felizmente, a vacinologia moderna tem passado por avanços conceituais e tecnológicos significativos nas últimas três décadas, resultando em novas vacinas aprimoradas. Esta revisão destaca os avanços mais importantes dos últimos 18 meses, com foco no desenvolvimento de vacinas contra três patógenos críticos: VSR (que ainda não tem vacina licenciada), TB e influenza (ambas necessitando urgentemente de vacinas mais eficazes).
Os estudos revisados ressaltam uma nova era da vacinologia, utilizando informações estruturais em nível atômico para o design de vacinas, plataformas genéticas inovadoras, engenharia de proteínas moderna e adjuvantes potentes.
Vírus Sincicial Respiratório (VSR)
O VSR é uma das principais causas de doenças respiratórias e mortalidade em lactentes, crianças pequenas e idosos. As primeiras tentativas de desenvolver uma vacina contra o VSR, nos anos 1960, falharam e resultaram em casos de exacerbação da doença respiratória associada à vacina.
Esse fracasso atrasou o desenvolvimento de vacinas contra o VSR por décadas, até que uma compreensão mais profunda da estrutura e função da glicoproteína de fusão (F) do VSR trouxe novos insights.
A proteína F do VSR é altamente instável e existe em uma conformação pré-fusão (pré-F), que medeia a entrada do vírus na célula. Entretanto, pode ser prematuramente convertida para sua forma pós-fusão (pós-F), reduzindo sua capacidade imunogênica.
Os primeiros esforços de vacinação contra o VSR incluíram predominantemente a proteína na forma pós-F, o que resultou em eficácia limitada.
A determinação da estrutura atômica da proteína pré-F revelou formas de estabilizá-la na sua conformação mais imunogênica, permitindo a produção de uma proteína recombinante estável.
Essa vacina candidata foi testada em um estudo clínico de fase I e demonstrou um aumento superior a dez vezes nos títulos de anticorpos neutralizantes em adultos saudáveis.
Além disso, a vacina DS-Cav1 pode ser formulada em nanopartículas auto-organizáveis altamente imunogênicas, contendo 20 moléculas pré-F estáveis, tornando essa estratégia promissora para futuras vacinas contra o VSR.
Influenza
O desenvolvimento de vacinas altamente eficazes contra a influenza continua sendo um grande desafio. As mutações virais, tanto leves/moderadas (deriva antigênica) quanto drásticas (deslocamento antigênico), resultam em variantes do vírus que escapam da imunidade prévia, levando a milhões de infecções globais todos os anos e causando entre 300.000 e 600.000 mortes.
As vacinas inativadas e atenuadas atuais são benéficas na redução dos impactos da influenza sazonal, mas sua eficácia varia significativamente, podendo ser tão baixa quanto 10% quando há desvios na correspondência entre a vacina e o vírus circulante.
Além disso, essas vacinas não protegem contra potenciais pandemias, como as causadas por cepas aviárias patogênicas (H5N1 e H7N9).
Vacinas de mRNA surgem como uma plataforma promissora para a influenza. A partir da sequência genética do vírus, é possível produzir uma vacina de mRNA em poucas semanas.
Estudos mostraram que vacinas de mRNA codificadas para hemaglutinina de duas cepas pandêmicas (H10N8 e H7N9) induziram respostas robustas e duradouras em ensaios clínicos de fase I, tornando essa tecnologia uma plataforma rápida e flexível para responder tanto à influenza sazonal quanto a surtos pandêmicos.
Tuberculose (TB)
A tuberculose é a principal causa de morte por doenças infecciosas no mundo. Estima-se que um quarto da população mundial esteja infectada com Mycobacterium tuberculosis, a maioria com infecção latente. Aproximadamente 10 milhões de novas infecções ocorrem anualmente, levando a 1,7 milhão de mortes.
O desenvolvimento de vacinas eficazes contra a TB tem focado na prevenção da progressão da infecção latente para a doença ativa.
Um estudo de fase IIb, randomizado e controlado por placebo, demonstrou que a vacina M72, composta por uma proteína recombinante de fusão (Mtb32A e Mtb39A) associada ao adjuvante ASO1E, reduziu em 50% os casos de TB ativa em adultos com infecção latente.
Além disso, um estudo de 2018 mostrou que a revacinação de adolescentes com BCG conferiu 45% de proteção contra a infecção inicial pelo Mycobacterium tuberculosis.
Esses achados reforçam a possibilidade de utilizar vacinas no século XXI para prevenir tanto a infecção primária quanto a reativação da TB.
Conclusão
Os artigos publicados nos últimos 18 meses demonstram o impacto das abordagens modernas para o desenvolvimento de vacinas, que utilizam o design estrutural, plataformas genéticas e formulações avançadas de proteínas recombinantes com adjuvantes potentes.
As vacinas no Século XXI têm o potencial de fornecer imunização eficaz contra algumas das doenças infecciosas mais devastadoras do mundo. A ciência das vacinas está evoluindo rapidamente, e essas inovações podem transformar a prevenção de doenças e salvar milhões de vidas nas próximas décadas.
Tradução do artigo: Novel vaccine technologies for the 21st century
Autores: John R Mascola e Anthony S Fauci